Há dias em que me apetece correr da memória os taipais de Portugal.
São os dias em que as facas afiadas não nos permitem enfrentar o poço de lágrimas que apetece encher quando carregamos de fininho no telecomando, para dar o peito às balas e em que, inebriados pelo cheiro a pólvora, somos metralhados com a decadência de um País ingovernável.
Veio-me esta querença um destes períodos quando, em casa, assobiava e tagarelava a música e tentava simular corporalmente a dança do Valle Del Chota, Equador, que fica na prega dos Andes. Nesse Valle, que tem a maior comunidade de negros trazidos pelos jesuítas no século XVII, celebra-se a vida difícil a cada momento ao ritmo de La Bomba.
Foi a meio de um qualquer noticiário do pior dos canais internacionais de um país dito civilizado, em que lacrimejei como alguém a quem tinham tirado, de repente, um dixe benquisto.
Senti Portugal como um doente e discorri: É isso mesmo, Portugal é um doente! Um imperador empalidecido numa lista de espera que teima em não acabar ou um náufrago que se agarra desesperadamente ao casco de um
Chaparral Signature tentando salvar-se da festa global da crise em que os americanos, do norte, profira-se, nos ensoparam.
Estaria se calhar a ser pessimista, mas as parangonas de um noticiário de rádio ou televisão, pasquim, tablóide ou desportivo mostram um país deprimido e depressivo. É disso que Portugal sofre. De uma depressão irreversível em que aqueles que teriam, em tese, a obrigação de o curar, foram atingidos por maleitas insanáveis, daquelas para que não há solução nos livros de farmacologia. Doenças raras como Freeportice, transmutação de um vírus há muito conhecido, mas sem cura, a que chamam Trafulhice.
Mas, desse cair de lágrimas, nem tudo foi nocivo.
Seguia já o directo para a porta de um qualquer tribunal, sede de partido ou estádio de futebol – espaços que têm muitos vasos comunicantes - quando me lembrei de uma visita que fiz ao Paraguai, uns meses antes da vitória do antigo bispo, Fernando Lugo, nas presidenciais do ano passado.
Aí, alvitrava eu para com os puxadores da porta do bólide em que seguia, se valeria a pena deixar-me das sulamericanices e regressar para o País onde, um dia, cada vez mais longínquo, tinha sido feliz.
Deixei-me ir naquela lentura sublime em que o canhenho se compraz, quase a reescrever as leis da física, quando escutei umas vozes ao ritmo de La Bomba, e tentei acelerar o mundo, como o fazem os habitantes do Valle del Chota, que fica ali na plica dos Andes.
Em boa hora o fiz.
Que te vaya bien!